quarta-feira, 28 de março de 2012

Marcelo José Santos




Pedras


A poeira que folheia as sombras ao vento 
hoje fere meus olhos enquanto sigo 
por esse caminho em que ninguém caminha comigo. 
Cerro-os então, ao descobrir que é agora um momento eterno. 
Sem futuro nem retorno ao passado, 
região em que essa poeira já foi pedra, 
como as que fincam-se entre os lírios. 
Meu desejo é então ser poeira, revirada pelo vento. 



Ao deus do vento


Ainda não entendo o dialeto do vento. 
O Minuano sussurrando ao ouvido 
das coxilhas palavras que só o espírito do tempo não esqueceu. 
O Alísio declamando aos coqueiros poemas da epopéia que se foi.
 Vento que acalma a pele áspera das montanhas. 
Arrasta as dunas através do deserto. 
Enche as naves das igrejas de todos os continentes. 
Vento que está sempre tocando, arranhando, refrescando,
 acariciando, eternamente passando. 



As estrelas de Sírius


Muito longe, muito longe de Sírios, um par de estrelas dançando, 
a vida, um livro escrito ao sabor do vento, me acomoda. 
Olho e no olho das pessoas está dita a única verdade: 
silêncio, melhor forma de descobrir segredos. 
Por isso, em nada cedo neste livro ao vento. 
Não sei o quanto escreve ou quanto sou escrito. 
A única certeza é o silêncio que cerca as estrelas de Sírius. 



Eterno retorno


A vida, sempre como o vento, 
capaz de mudar as paragens por 
que passa mas incapaz de voltar. 
E os dias se sucederão. E após a noite 
virá um dia até o fim dos tempos. 
Mas o que de semelhante 
há entre o 23 de novembro que é hoje 
e o vinte e três de novembro de um século futuro? 
Só a constatação de que a fuga é impossível, 
de que o destino sempre se fecha em si mesmo 
e de que o Nilo sempre inunda no retorno de Sírius. 



Sonhando


Ando por essas ruas, 
Perco-me nesta tarde, 
Saúdo a todos em meu caminho. 
Alguns vieram d’outros séculos. 
Olham para o alto dos edifícios 
Como se vislumbrassem pirâmides. 
Entram em automóveis como se fossem 
Barcos para atravessar a aurora. 
Sobre essa ponte, a vida se vai e eu fico, 
Sonhando com a areia dos dez desertos 
Que o tempo cultivou dentro de mim. 


Marcelo José Santos
Recife - PE (1974)

Nenhum comentário:

Postar um comentário