port bou: a fronteira de um atrabiliário
trouxeram-te a melancolia por herança
ninguém a suportaria
destinatário desta solidão
amigos te escreveram & escreveram
as cartas nunca chegaram
refugiado numa rua de mão única
dela fizeste tua trincheira
uma esperança tão inútil
quanto as asas de um anjo
[filho predileto teu olhar teu horizonte
estilhaçados]
nem tudo melhora depois de uma guerra
amor morte selos postais: o que mais
caberia em tua maleta de passagens?
já não corres atrás de uma aura
mal atravessaste os pirineus
caíste na última fronteira da razão
nem te adiantaria colher flores
à margem de um rio
[resolveste te juntar a elas!]
na trilha de Kerouac
decerto que o coiote venceria
o deserto
sugaria seus cactos
& se lançaria colina abaixo
/já que você amarrou seus sapatos/
desatou-se de todos os destinos
nada deterá o caminho
muros & montanhas removem-se
ante teus passos
uma luz atravessa teus olhos
a busca nunca será vã
& deixa rastros na estrada
tua herança vertiginosa
acenderá o uivo na madrugada
vejo a pérola sob teus pés
quero ar que movimenta
poeira em precipício
por overdose de vida
silencifrado
aprendi a infernizar o mundo
assumi a nave da loucura
soerguida a bandeira da solidão
arrisco-me navegar à deriva
seguir a luz que me guiará
à destruição
me mexo do lado [de dentro]
me estremeço do lado de fora
dou diversos nomes ao fogo
[em seguida queimo-os!]
fui capaz de um hospício para abrigar
a poesia
essa miséria louca
é perigoso acostumar-se a ela!
procuro ocupar um lugar já ocupado
um método para destruir deus
& aguentar as pontas/ segurar/ manter
Se preciso enterrar-me com a literatura
benoni araújo
Belém – PA (1968)
Olá, conheço os textos do Benoni há um tempo e gosto bastante. Parabéns pelo blog.
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