quinta-feira, 18 de novembro de 2010

Raquel Naveira



O poeta é um narciso


O poeta é um narciso:
Flor que cintila
Brilhante
Sobre o lago liso.

O poeta é um narciso
Que perfuma,
Entorpece,
Penetra nos poros e frisos.

O poeta é um narciso
Que cresce na primavera,
Nos úmidos pisos.

O poeta é um narciso,
Lírio de vaidade
E pouco siso.

O poeta é um narciso
Que paira sobre o rio,
Refletindo o céu, a floresta, o riso.

O poeta é um narciso,
Ao menor suspiro
Que exale
Dá à imagem evocada
A aura do mito.



O poeta é um cisne


O poeta é um cisne,
Ave imaculada
Cheia de poder e graça;
Nas noites de lua
Despe seu manto de plumas
E anda nu
Despejando sêmen e espumas.

O poeta é um cisne,
Druida vestido de branco,
Pontífice sagrado
Inspirado pela luz
Que incide no lago
Imagens distorcidas
Da realidade.

O poeta é um cisne
De celeste onipotência,
Transbordando audácia,
Seu canto amoroso
É prenúncio de morte
Para si
E para o mundo.

O poeta é um cisne,
Anjo elegante
Ligado por corrente de prata
A uma casta superior.

O poeta é um cisne,
Um nobre
Navegando
No reino infinito do espírito.



O poeta é um centauro


O poeta é um centauro:
A mente de homem
Aclara ideias,
Articula palavras
E as pernas de cavalo,
Cheias de energia,
Saltam no ímpeto da emoção.

O poeta é um centauro:
Alimenta-se de carne crua,
Bebe vinho,
Embriaga-se
E depois chora
Arrependido
Fazendo brotar fontes
Com a pancada de seus cascos.

O poeta é um centauro:
Uma força bruta,
Que rapta,
Violenta,
Cega
E depois se põe a serviço
Do bom combate.

O poeta é um centauro:
Galopante,
Sangue nas veias,
De repente, se controla,
Se domina
E estende o olhar triste
Pela campina.

O poeta é um centauro:
De dia
Evita pânico
E de noite, comanda
Rumo à loucura,
À morte,
Ao triunfo.

O poeta é um centauro:
Montaria,
Veículo,
Nave
De sua própria poesia.


Raquel Naveira
Campo Grande – MS (1957)

Um comentário: