quarta-feira, 2 de março de 2011

Ronald Augusto



no assoalho duro


me aproximo de tombar em sono suave
em bairros os cachorros latem
digo: cantam de galo no terreiro
à tarde esperam sobre esporas altaneiros
os galos a que me referi acima
ciscam em consideração às galinhas
também não sobra muito para o caderno
hão passado verão outono inverno
e muito está aqui enfeixado
e tudo mais que passou por apagado
já esse posfácio não sai fácil
feito os outros de bem outro hábito
escrever sem prévio rascunho
assim levado a reboque do próprio punho
não me é um bem como antes fora
faço papel de tolo jogral fora de hora
querendo levar a cabo missão sem solda e soldo
água em cuja superfície áporos a rodo
enquanto mais ao fundo lodo-areia
no qual não há que pise sequer de meias
e rimas oficiando o que já é um rito
acabar cuaderno escrevendo esquisito
felizmente minha fabulação manca
estou com travas na fala trancas
não há indulto possível para poeta
que não se toca ou diz não à caixa-preta
que melhor memória manuseável externa
pode haver para se ler os destroços da cena?
o pânico da audiência minutos segundos antes
o vômito no saco da crítica no chão restante
barra o sono essa conversa errorosa
melhor num outro dia dar sítio à prosa



dias de negro


efeito de cálculo da desmedida
frederico nietzsche
filósofo crítico da decadência
na autopropaganda na autodevoração
da vida-obra
estilo-insulto voltado para um leitor
tão barra-pesada e perturbador quanto ele
a cada desviar e virar de página
mais o indentifico a vincent van gogh
a hiperestesia hiperfilosofia
sua misoginia impertinente
feminina corrosiva do matriarcado
de pindorama do antropófago que gama

penso também – e não estou
de brincadeira – na música
do tim maia racional
um álbum sem lugar nas paradas
empedernidas do pardieiro do meio
a inigualável criação do síndico
um disco-risco raro
condenado à extinção e sempiterno
porque não pode ser repetido
tim maia racional
misto tropicalista de idealismo
e zaratustra anticristo
o parecer de nietzsche: obra para estômagos
ou buchos ruminantes
sadios


ronald augusto
Rio Grande – RS (1961)

Um comentário:

  1. uma análise sobre No assoalho duro em: http://sisifosemperdas.blogspot.com/2011/02/no-assoalho-duro-o-movimento-da-escolha.html

    abraços!

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